terça-feira, 30 de outubro de 2012

A MORTE E SEUS MISTÉRIOS

A desencarnação não é, segundo o Espiritismo,
igual para todos, mas depende do estado
moral da pessoa, quando encarnada
 
 
 
A certeza da vida futura não exclui as apreensões do homem quanto à desencarnação. Há muitos que temem não propriamente a vida futura, mas o momento da morte. Será ele doloroso? Tentando elucidar essas questões, Allan Kardec inquiriu  os  Espíritos e  deles  recebeu a   informação de  que o corpo  quase  sempre  sofre  mais  durante  a  vida  do  que  no momento da morte e que
os sofrimentos que algumas vezes se experimentam no instante da morte são um gozo para o Espírito.

É preciso, no entanto, que consideremos que a desencarnação não é igual para todos, mas, ao contrário, há uma variação muito grande, visto que numerosas são as formas de viver adotadas pelos encarnados. Vendo-se a calma de alguns moribundos e as convulsões terríveis de outros, pode-se previamente julgar que as sensações experimentadas nem sempre são as mesmas.

A separação da alma é feita de forma gradual, pois o Espírito se desprende pouco a pouco dos laços que o prendem, de forma que as condições de encarnado ou desencarnado, no momento do desenlace, se confundem e se tocam, sem que haja uma linha divisória entre as duas.

Alguns fatores podem influir para que o desprendimento ocorra com maior ou menor facilidade, fatores relacionados com o estado moral do homem quando encarnado. A afinidade entre o corpo e o perispírito é proporcional ao apego do indivíduo à matéria, que atinge seu ponto máximo no homem cujas preocupações dizem respeito exclusivamente à vida de gozos materiais. Ao contrário disso, nas almas puras – que antecipadamente se identificam com a vida espiritual – o apego é quase nulo.

O desprendimento da alma jamais
é brusco, mas gradual

Em se tratando de morte natural resultante da extinção das forças vitais por velhice ou enfermidade, o desprendimento opera-se gradualmente. Para o homem cuja alma se desmaterializou e cujos pensamentos se destacam das coisas terrenas, o desprendimento quase se completa antes da morte real, ou seja, tendo o corpo ainda vida orgânica, o Espírito já começa a penetrar a vida espiritual, apenas ligado à matéria por elo tão frágil que se rompe com a última pancada do coração.

No homem materializado e sensual, que mais viveu do corpo que do espírito, e para quem a vida espiritual nada significa, tudo contribui para estreitar os laços materiais; e quando a morte se aproxima, o desprendimento, embora também se opere gradualmente, demanda contínuos esforços. As convulsões da agonia são indícios da luta do Espírito, que às vezes procura romper os elos resistentes e outras vezes se agarra ao corpo, do qual uma força irresistível o arrebata com violência, molécula por molécula.

O desconhecimento da vida espiritual faz com que o Espírito se apegue à vida material, estreitando seus horizontes e resistindo à morte com todas as forças, com o que consegue prolongar a vida e, conseqüentemente, sua agonia, por dias, semanas ou meses. Em tais casos, a morte não implica o fim da agonia, pois a perturbação continua e ele, sentindo que vive, sem saber definir seu estado, sente e se ressente da doença que pôs fim aos seus dias, permanecendo com essa impressão indefinidamente, uma vez que continua ligado à matéria por meio de pontos de contato do perispírito com o corpo.

Dá-se o contrário com o homem que se espiritualizou durante a vida. Depois da morte, nem uma só reação o afeta. Seu despertar na vida espiritual é como quem desperta de um sono tranqüilo, lépido, para iniciar uma nova fase de sua vida.

No suicídio, a separação da alma
é bastante dolorosa

Nas mortes violentas, como nos acidentes, tendo em vista que nenhuma desagregação se iniciou antes da separação do perispírito, o desprendimento só começa depois da morte e seu término não ocorre rapidamente. O Espírito fica aturdido, não compreende seu estado, permanecendo na ilusão de que vive materialmente por período mais ou menos longo, conforme seu nível de espiritualização.
Nos casos de suicídio, a separação da alma é extremamente dolorosa. 

Constituindo o suicídio um atentado contra a vida, o sofrimento quase sempre permanece por período igual ao tempo em que o Espírito deveria estar encarnado. Além disso, as dores da lesão física provocada repercutem no Espírito. A decomposição do corpo e sua destruição pelos vermes são sentidas pelo Espírito desencarnado, conquanto tal fato não constitua regra geral. Há ademais o remorso, gerando sofrimento moral para aquele que decidiu desertar da vida.

O espírita sério, adverte-nos Kardec, não se limita a crer, porque compreende, e compreende, porque raciocina. A vida futura é para ele uma realidade que se desenrola incessantemente aos seus olhos, uma realidade que ele toca e vê a cada passo, e de tal modo, que a dúvida não pode ter guarida em sua alma. A existência corporal, tão limitada, amesquinha-se diante da vida espiritual. Que lhe importam os incidentes da jornada, se compreende a causa e a utilidade das vicissitudes humanas quando suportadas com resignação?

A alma se eleva então em suas relações com o mundo visível; os laços fluídicos que a ligam à matéria enfraquecem-se, operando por antecipação um desprendimento parcial que facilita a passagem para a outra vida. A perturbação conseqüente à transição pouco perdura, porque, uma vez franqueado o passo, para logo se reconhece, nada estranhando, mas antes compreendendo sua nova situação.

A prece é útil no desprendimento
da alma

O desprendimento da alma, uma vez morto o corpo físico, começa pelas extremidades e vai-se completando na medida em que forem desligados os laços fluídicos que a prendem ao veículo carnal.

No livro Obreiros da Vida Eterna, de André Luiz, cap. XIII, o instrutor Jerônimo informa que há três regiões orgânicas fundamentais que demandam extremo cuidado nos serviços de liberação da alma: o centro vegetativo, ligado ao ventre, como sede das manifestações fisiológicas; o centro emocional, zona dos sentimentos e desejos, sediado no tórax, e o centro mental, situado no cérebro. 

Essa foi a ordem em que ele atuou    para facilitar o desprendimento de Dimas, descrito no referido livro.
A prece auxilia bastante o desprendimento do Espírito. Allan Kardec relata no livro O Céu e o Inferno o caso Augusto Michel, ocorrido em 1863, o qual pediu a um médium fosse até o cemitério orar no seu túmulo. O Espírito de Augusto Michel suplicou tanto, que o médium atendeu e no próprio cemitério ouviu o agradecimento de Michel, que se disse aliviado da constrição que antes o fazia preso ao corpo.

 Ao comentar o caso, Kardec indaga se o costume quase geral de orarmos ao pé dos defuntos não proviria da intuição inconsciente que se tem desse efeito.

ANO 1 Nº  13  Astolfo de Oliveira Filho
   

sexta-feira, 26 de outubro de 2012




Os animais têm alma e são também
seres em evolução
Todos nós que convivemos com animais sempre nos sensibilizamos com suas demonstrações de companheirismo e afetividade. 

É comovedor o testemunho do Padre Germano ("Memórias do Padre Germano", de Amália Domingos Soler, FEB) a respeito de Sultão: "Pobre animal! Pesa-me dizê-lo, mas é a verdade: encontrei num cão o que nunca pude encontrar num homem. Quanta lealdade, cuidado, solicitude!".

Também nos surpreendemos com suas atitudes inteligentes. Em "A Gênese", cap. III, itens 11 a 13, de Kardec, lê-se: "... isso (a inteligência) é um atributo exclusivo da alma... O animal carniceiro é impelido pelo
instinto a nutrir-se de carne; porém, as precauções... sua previsão... são atos de inteligência".

Hoje, a Etologia, ciência do comportamento, criada por Konrad Lorenz, confirma plenamente esse enfoque kardequiano, demonstrando que os animais são seres inteligentes. Aliás, com capacidade muito além da que supúnhamos. Leia-se, a respeito, entre outros, "O Parente mais Próximo", de Roger Fouts, biólogo americano que durante mais de 30 anos trabalha com chimpanzés, ensinando-lhes a linguagem gestual dos surdos-mudos.

Voltemos a Kardec, "O Livro dos Espíritos", item 597: - "Pois se os animais têm uma inteligência que lhes dá uma certa liberdade de ação, há neles um princípio independente da matéria? Resposta: Sim, e que sobrevive ao corpo".
Muitos são os relatos a esse respeito que consegui inserir em meu livro A Questão Espiritual dos Animais, publicado pela FE - Folha Espírita. Este me foi transmitido pessoalmente pelo querido confrade Divaldo Pereira Franco: Divaldo chegou certa vez a Campo Grande, tendo sido recebido por D. Maria Edwiges, então presidente da Federação Espírita do Mato Grosso. Ao entrar em sua residência, pulou-lhe ao peito enorme cachorro. As pessoas que o acompanhavam, sem se aperceberem do que realmente estava acontecendo, indagam-no sobre sua inesperada reação. Divaldo responde: "Eu me assustei com o cachorro, mas está tudo bem!" Ouve deles em seguida: "Que cachorro, Divaldo, aqui não tem
cachorro nenhum!", ao que ele retruca: "Tem, sim, esse pastor aí!" Percebe então que D. Maria Edwiges se emociona ao comentar: "Divaldo, eu tive um pastor, mas ele morreu há meses!"

Outro caso que relato, encontra-se originalmente no livro "Testemunhos de Chico Xavier", de Suely Caldas Schubert, FEB, onde se lê o seguinte depoimento de Chico: "Em 1939, o meu irmão José deixou-me um desses amigos fiéis (um cão). 
Chamava-se Lorde e fez-se meu companheiro... Em 1945, depois de longa enfermidade, veio a falecer. Mas, no último instante, vi o Espírito de meu irmão aproximar-se e arrebatá-lo ao corpo inerte e, durante alguns meses, quando o José, em Espírito, vinha ter comigo, era sempre acompanhado por ele... 

vida é uma luz que se alarga para todos..."
Motivada por tantas evidências, passei a buscar na literatura espírita, particularmente nas obras de Kardec, como na ciência acadêmica, informações que elucidassem tantas questões sobre a espiritualidade dos animais, e as "coincidências" que encontrei são surpreendentes! Por exemplo, hoje a ciência admite ser o sistema nervoso, em especial o cérebro, o "órgão" (do grego organon = meio, recurso, instrumento) de expressão da mente. 

Pois bem, André Luiz, em "No Mundo Maior", cap. 4, informa que: "O cérebro é o órgão sagrado de manifestação da mente, em trânsito da animalidade primitiva para a espiritualidade humana". 

Também é impressionante a correlação que se pode fazer entre o "cérebro trino" de Mac Lean, autor clássico na ciência, com a configuração de nossa casa mental e sua relação com diferentes partes do cérebro, expressa por André Luiz no livro "No Mundo Maior", cap. 3 e 4.
Era a deixa que eu queria, pois como veterinária e espírita acabei encontrando um leito para dar fluxo às muitas idéias que pululam na mente de todos nós, sobre os animais.

Muitos dos temas são ainda tratados como questão, isto é, como matéria em discussão, uma vez que existem muitas perguntas sem resposta definitiva. 
São eles: a filogenia do cérebro e da mente, o significado do sofrimento nos animais, a presença de figuras animais no plano espiritual (a questão da erraticidade, do desencarne e da reencarnação), a existência dos "espíritos da natureza", a abordagem ética e doutrinária do comer ou não comer carne e a validade do uso de animais na chamada zooterapia.

Defendo a tese de que os animais são seres em evolução, tanto orgânica quanto espiritual. 

São nossos companheiros de jornada, merecendo ser respeitados e, sobretudo, amados. Como diz o mentor Alexandre, em "Missionários da Luz", cap. 4, de André Luiz: "Abandonando as faixas de nosso primitivismo, devemos acordar a própria consciência para a responsabilidade coletiva. A missão do superior é a de amparar o inferior e educá-lo".

Que Jesus abençoe nossos esforços para entender a beleza de toda a criação, na qual não devemos nos colocar como destacados senhores, mas, sim, na condição de Espíritos ainda no aprendizado de primárias lições!

ano 1 nº 9
 

terça-feira, 23 de outubro de 2012


VOCÊ SABE QUEM É,
MAS SABE O QUE É?

      A morte amedronta tanto o ser humano, que este assume posturas as mais variadas, desde aquelas infantis, em que nega toda a sua maturidade, até outras em que chega a negar a sua condição de ser racional.

 É profundamente estranho que essa criatura, que se pavoneia de ser o rei da criação, se mostre tão dolorosamente despreparada diante da única certeza comum a todos os seres humanos.

Ao interrogarmos uma pessoa onde quer ser enterrada quando morrer, certamente ouviremos como resposta a designação de um local de sua preferência. Ao ser interrogada sobre o destino da sua alma, certamente responderá que irá para o céu.
 Mas a fragilidade desse posicionamento é facilmente demonstrável diante de um simples questionamento: "E se ela não for para o céu e sim para o inferno, que isso importa a você, pois é ela quem vai e não você? Você não disse que deseja ficar enterrado em tal lugar?"
 Essas perguntas causam perplexidade e levam muitas pessoas, pela primeira vez, a usarem seu raciocínio no exame do assunto morte. Depois de algum tempo, costumam aparecer saídas como esta, ditas até em tom vitorioso: "Não sou eu quem vai ser enterrado em tal lugar; é o meu corpo!" Com essa afirmativa, ao invés de resolver o problema, agrava-o ainda mais..

O ar de vitória desaparece logo, ao se lembrar à pessoa que ela usou dois possessivos: meu corpo e minha alma. Ora, o possessivo, como bem ensinam as gramáticas, é a palavra que indica posse. Se há posse, há possuidor. Quem é o possuidor daquele corpo e daquela alma? Quem está habilitado a apresentar-se como proprietário e, conseqüentemente, reclamar-lhes a posse?

É exatamente essa falta de racionalidade que leva o homem a fugir do assunto, portando-se como a criança que, ao esconder o rosto atrás das mãos, imagina ter resolvido o problema do seu esconderijo. Ou como o avestruz que, segundo dizem, esconde a cabeça sob a areia, pensando assim fugir do perigo.
A criatura humana recusa-se a pensar, porque pensar na morte dói. Meditar, refletir sobre a questão, só pode revelar-lhe a sua fragilidade, o seu despreparo diante do magno assunto.

E qual a saída para o impasse? 

A única posição lógica é aquela de o homem assumir a sua condição de Espírito imortal, detentor da posse de um corpo físico, pelo qual ele se manifesta temporariamente, enquanto esse corpo tiver vida. É o Espírito que pensa, que aprende, que odeia, que ama. O corpo é mero instrumento de uso transitório. Pode-se até dizer que é descartável.
 O Espírito, não. 
Ele é imortal, indestrutível.
É o arquivo vivo de todas as experiências vividas durante a romagem terrena.

Com o fenômeno da morte, o Espírito se afasta do corpo que já não mais lhe serve como instrumento, podendo dizer, na ocasião: "habitei esse corpo, serviu-me ele de vestimenta durante muitos anos". O corpo jamais poderá dizer: "Esse espírito que aí vai foi meu", simplesmente porque o corpo é matéria morta, que começa a decompor-se tão logo ocorra a morte.

Ao conscientizar-se dessa realidade, o homem passa a ter uma verdadeira consciência de imortalidade. Quanto mais medita sobre o assunto – desde que desligado de explicações de determinados teólogos – tanto mais adquire um estado de consciência a que se pode chamar "cidadania espiritual". Passa a sentir-se imortal. A morte já não mais se constitui naquele desastre terrível a bi- ou tripartir-lhe o ser: "Vou para debaixo da terra, minha alma vai para o céu e eu para não sei onde."

Ao assumir a cidadania espiritual, seus horizontes se alargam. Já não é apenas um homem, mas um Ser imortal, cujo destino não se prende apenas à Terra, vez que se sente pertencente ao Universo, às "muitas moradas da casa do Pai", conforme ensinamentos de Jesus. 

Assim pensando, chegamos à conclusão de que somos essencialmente espíritos, atualmente encarnados. Um dia deixaremos nosso corpo terrestre, como Jesus deixou o seu, conservando apenas o corpo celeste, imortal, conforme o Mestre, de forma genial ensinou e exemplificou!

Fica, entretanto, para muitas pessoas, uma pergunta que invariavelmente aparece quando são feitos estes comentários: Se o túmulo estava vazio e o corpo com que Jesus se apresentava era espiritual, onde ficara seu corpo físico? O Mestre, evidentemente, não podia esclarecer o assunto àqueles com quem convivera, conforme se comprova em suas palavras, já citadas: “Ainda tenho muito a vos dizer, mas não o podeis suportar agora.” (Jo, 16: 12).
Cumprindo a promessa de Jesus, o Consolador vem relembrar as suas lições e explicar muitos fatos que foram registrados pelos Evangelistas, mas que, à época, não foram compreendidos, como as súbitas aparições de Jesus no cenáculo e na pesca, e o seu desaparecimento desconcertante diante dos companheiros de caminhada a Emaús.

 Tais fatos, tomados por miraculosos por muitos teólogos, encontram no Espiritismo explicações claras e lógicas, não no campo das especulações teológicas, mas dentro da objetividade da Ciência, nas pesquisas do fenômeno de materialização – hoje chamado ectoplasmia pelos parapsicólogos – levado a efeito por vários cientistas, entre os quais se destaca a figura de Sir William Crookes o célebre físico inglês, que pôde provar que o Espírito Katie King, com seu corpo espiritual materializado, limitava-se dentro do plano material como se estivesse encarnado, tornando-se visível, audível e tangível.(“Fatos Espíritas”, William Crookes; “História do Espiritismo”, Arthur Conan Doyle).

Quanto ao desaparecimento do corpo físico de Jesus, pode-se ler esclarecimento sobre a dissipação de fluidos remanescentes em cadáveres, no livro “Obreiros da Vida Eterna”, de André Luiz (caps. 15 e 16). 

Trata-se de operação piedosa levada a efeito por benfeitores espirituais, que dissipam na atmosfera os fluidos remanescentes no corpo, antes do sepultamento, afim de resguardá-lo de profanação que poderia ser levada a efeito por Espíritos inferiores.

Fazendo-se um paralelo, é lícito supor que o próprio Mestre se haja encarregado de dissipar as energias remanescentes em seu corpo e, ao fazê-lo, desmaterializou-o completamente. 

É fácil entender que o corpo de Jesus não poderia ficar no túmulo, pois quando se divulgasse a notícia que o Mestre ressurgira da morte, ele seria fatalmente exposto pelos sacerdotes, a fim de negar a ressurreição, que, para quase todos, era apenas física.

 E não seria essa a resposta à pergunta crucial deixada no ar pelos cientistas que estudaram exaustivamente o Sudário de Turim, que apresenta impressa  a figura de um homem, cujas características coincidem com o que se sabe a respeito do corpo de Jesus, tanto no que tange às características físicas, quanto aos sofrimentos que lhe foram impostos, sem que hajam eles conseguido saber que tipo de fenômeno ocorreu na superfície do tecido para fixar, de maneira impressionante, aquela imagem?

Entretanto, é inegável que essa impressão no tecido não foi provocada por radiação, nem por calor, nem por tintura, nem por pintura. Até hoje não se sabe o que provocou aquelas impressões que permitem a um computador restaurar a figura de um cadáver que fora flagelado e crucificado, antes de ser deposto sobre aquele pano.

Concluindo, pode-se dizer que o Espiritismo, ao decodificar a mensagem de imortalidade deixada por Jesus, esclarece-nos a respeito do que verdadeiramente somos:  Espíritos imortais, temporariamente encarnados em corpos mortais!
José Passini           


sexta-feira, 19 de outubro de 2012



 

Angélica dos Santos Simone
2012: O ano do Dragão  

Que nós possamos aproveitar o ano do Dragão e renovar as nossas ideias e percepções do mundo e das pessoas; todo
solo só é fértil quando o fogo limpa as ervas daninhas
e a água retira os cascalhos
 
O ano de 2012 será, segundo o horóscopo chinês, o ano lunar do Dragão. Sua periodicidade ocorre a cada doze anos e para a cultura chinesa este animal representa a água: mares, cachoeiras, rios, lagos, oceanos etc., e seu domínio sobre eles. O Dragão chinês é o oposto do Dragão ocidental, este é lembrado pela sua capacidade em manipular o fogo que carrega consigo e é expelido pela sua boca. Podemos falar em uma mitologia terrestre, pois apesar das diversas manifestações em cada cultura espalhadas pelo globo, existe uma ideia que é geral e básica em todos os territórios e épocas, donde se conclui que o tronco mitológico é o mesmo, mas é nos galhos que as peculiaridades locais ocorrem, com cada cultura adicionando sua forma em um conteúdo que é geral. Por exemplo, na América pré-colombiana e em algumas culturas amazônicas encontramos a serpente alada ou emplumada, a qual corresponderia ao Dragão e que possui a mesma capacidade de transformação do ambiente por onde ela passa.
 

Mudanças etárias 

Alcançamos a proeza dos 7 bilhões de habitantes (para mais), e em alguns países já se faz presente a escassez de matéria-prima e de recursos naturais (com apenas dois séculos de industrialização massiva). Os programas espaciais investem em pesquisas sobre desenvolvimento de vegetais à gravidade zero, enquanto o planeta Terra se transforma desde as suas camadas rochosas modelando novas paisagens onde na primeira fase possuem a aparência de destruição, mas que ao longo dos séculos elas adquirirão novos fácies, novos elementos e novas dinâmicas.
Estamos no momento de reajustamento das camadas mais baixas da Terra, movimentadas pelo magma, ou seja, a primeira fase, onde são produzidas paisagens de destruição. Os estudos geológicos e geográficos realizados até então e a tecnologia desenvolvida para a previsão de terremotos, maremotos, furacões, tufões, tsunamis etc. permanecem e aguardam apenas a previsão, pois evitar tais eventos não é da capacidade humana.  

O elemento Fogo 

O Dragão ocidental, portanto, representa o fogo. Este elemento que permitiu o nascimento das sociedades humanas há milhares de anos permanece quase que desconhecido pelo ser humano quanto às suas propriedades e manifestações em diferentes ambientes. Sabemos da capacidade do fogo em transformar paisagens e a rapidez com que o faz; em alguns lugares, sua presença é fator necessário para manter o equilíbrio do ambiente, como no caso do bioma Cerrado.
O fogo, tal como o conhecemos, é matéria em combustão. Para gerá-lo nos ambientes terrestres é necessária a presença de um composto químico orgânico (madeira, papel, combustível etc.) que, em contato com uma substância oxidante (como a atmosfera), e somada à energia acionada na matéria (como o ato de esfregar um graveto em um pedaço de madeira), resulta na liberação de calor e de luz proveniente dos gases que se encontram em combustão. A cor da chama equivale à combinação dos elementos químicos presentes neste processo. Tanto o calor como a luz são fontes de energia geradas de um mesmo elemento.
Este processo e tudo o que ele gera não aconteceria sem o movimento, intrínseco e essencial para que a transformação ocorra.
O elemento fogo, portanto, é encontrado em todos os cantos do universo, enquanto a vontade divina exigir a sua manifestação para cumprir a função de criar, destruir e criar novamente. Assim, sem a destruição não há criação, pois como aponta sucintamente a Lei de Lavoisier (séc. XVIII): “Na natureza (na matéria), nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Este postulado nos mostra que, na matéria, o ser encarnado deve compreender que a natureza se movimenta em ciclos dos quais ele também é parte importante, pois é força que tem a capacidade de transformar a paisagem desde o seu conteúdo, resultando em novas formas no espaço.
O único não-criado é Deus.
Devemos lembrar que a vida inicia-se muito antes da formação de um planeta complexo, nos berçários celestes, onde dormem e acordam estrelas que darão continuidade na formação de galáxias e de sistemas solares, tais como a nossa Via Láctea e o nosso Sistema Solar presidido por uma estrela – o Sol. Uma estrela muito jovem, ela possui a sua chama de coloração avermelhada, ao passo que as estrelas em colapso e seus restos emitem a coloração azulada.  

Labores do século XXI 

Iniciamos o século XXI com poucas certezas e muitas dúvidas. Digamos que, à parte o pessimismo, o nosso planeta não iniciou o presente século com o “pé direito”, pois as políticas internacionais ainda são pautadas na guerra e na economia financeira. Os trabalhos dos grandes pensadores do século XX, apesar de sua contribuição impagável para o desenvolvimento da raça humana, infelizmente permanecem nos arquivos das bibliotecas, consultados mais pelas traças e pela poeira do que pelos líderes mundiais.
Desta maneira, podemos pensar sobre a tão sonhada mudança de paradigma pela qual cientistas e religiosos clamam desde as guerras mundiais, motivo entoado pela geração dos anos 1980 do século passado, a mesma geração que hoje se encontra na casa dos vinte anos e que usufrui da tecnologia, a qual é capaz de compreender sem o manual de instruções, mas que continua a carregar a falha moral das gerações herdadas.
Denominamos catástrofe qualquer evento que possua escala suficiente para impressionar a nós, seres humanos: catástrofes ambientais, sociais, naturais etc.. Aquelas que são provocadas pelo próprio planeta possuem um fim, pois nos esquecemos de dizer para nossos alunos, no primeiro dia de aula da disciplina de geografia, que a Terra é um organismo vivo, e, como tal, se movimenta ininterruptamente. Este movimento gera modificações na paisagem e na organização social das populações que vivem na superfície.
André Luiz, no livro – Obreiros da Vida Eterna (2003), compartilha conosco a experiência da utilização do elemento fogo no plano espiritual que, através dos choques magnéticos provocados por aparelhagem especializada, concorre para que ocorra a purificação consciencial nos planos densos do planeta. Enquanto André vivia experiência de estudo em uma casa socorrista transitória localizada na crosta, equipe de desintegração magnética realizou trabalho periódico de limpeza da área onde estava localizado o posto:
“[...] Clarão de terrível beleza varou o nevoeiro de alto a baixo, oferecendo, por um instante, assombroso espetáculo. Não era bem o relâmpago conhecido na Crosta, por ocasião das tempestades, porquanto as descargas elétricas da Natureza, sobre o chão denso, são menos precisas no que se refere à orientação técnica de ordem invisível. Observava-se, ali, o contrário: a tormenta de fogo ia começar, metódica e mecanicamente”. (p. 61) 
Para atender às angústias originadas das dúvidas que assolavam a mente de André, seu preceptor oferece-lhe breves apontamentos:
“O trabalho dos desintegradores etéricos, invisíveis para nós, tal a densidade ambiente, evita o aparecimento das tempestades magnéticas que surgem, sempre, quando os resíduos inferiores de matéria mental se amontoam excessivamente no plano”. (p.162)
O resultado de tal investida dos céus assombrou os habitantes da densa área, que ora suplicavam o amparo desinteressado do prestimoso pronto socorro, no entanto, nem todos eram merecedores do auxílio urgente, pois a áurea, sinalizadora dos verdadeiros arrependidos, era escura e densa na maioria dos que clamavam perdões e misericórdias: “Ondas maciças de sofredores aterrados começaram a alcançar as defesas [do posto socorrista]. Era dolorosa a contemplação da turba amedrontada e expectante”. (p. 163)
Interessante quadro nos mostra à imaginação quando da leitura desta experiência. Inúmeros textos desenvolvidos por ilustres escritores descrevem o “choro e ranger de dentes”, neste derradeiro “juízo final”, onde a presença e sensação do fogo remetem-nos ao inferno de Dante Alighieri em sua Divina Comédia, algo da mitologia onde a raiz está em uma verdade inquestionável. 
“Quase quatro horas difíceis se escoaram, exigindo-nos delicada atenção na tarefa. E, agora, a paisagem era mais sufocante, mais terrível... Serpentes de fogo [salamandras] desenovelavam-se dos céus e penetravam no solo, que começou a tremer sob nossos pés. O calor asfixiava. Sentindo os elementos vacilantes que nos ladeavam, recordei velha descrição do maremoto de Messina, em que, sob o auge do pavor, diante da Natureza perturbada, não sabiam as vítimas como se colocarem a caminho do salvamento, porquanto, em torno, a terra, o mar e o céu se conjugavam num ciclópico e sincrônico arrasamento.” (p. 166) [1]
A descrição feita pelo autor é materializada na forma dos incêndios que ocorrem na superfície terrestre, expulsando qualquer tipo de vida por onde ele passa: “Sorvedouros de chamas surgiam próximos e tamanha gritaria se verificava, em derredor, que tínhamos perante os olhos perfeita imagem de vasta floresta incendiada, a desalojar feras e monstros de furnas desconhecidas.” (p. 167)
Confirmamos nas experiências do além-túmulo a contínua utilização deste elemento nas tarefas de limpeza e revigoramento de áreas inundadas pelas mais densas placas de baixas vibrações. Podemos pensar ou imaginar sobre como estaria o nosso planeta, se a espiritualidade invisível não cuidasse de um mundo que muitos ainda desacreditam existir.

O fogo propõe a Renovação

Alimentado pela centelha do elemento fogo, que destrói o velho e abre campos para que germine o novo, o Dragão se apresenta em sua primeira aparição trazendo consigo as chamas da Renovação.
A renovação é uma proposta coletiva e individual.
Decorre que o ano de 2012 é o ano da Renovação, pois quando o fogo elimina aquilo que se tornou ocioso, tem-se um campo pronto para o plantio. Mesmo sabendo que o uso da prática de queimada nas plantações (coivara), para subsistência, é ultrapassado, pois, como são realizadas seguidas vezes, ela causa a exaustão do solo (afinal, o tempo do homem é diferente do tempo da natureza). Tal situação define-se de maneira diferente no contexto do Cerrado, como relatado acima, onde o fogo é fator determinante para a renovação da vegetação e do alimento para os animais e se movimenta de acordo com o tempo e medida exatos às necessidades deste ambiente.
A etimologia do termo renovar segue-se do latim: re = outra vez e novare = tornar novo.
A proposta para o ano do Dragão é utilizar o seu fogo renovador e queimar tudo aquilo que se tornou ocioso em nós. Como sabemos que nada se perde, mesmo o que é queimado produz outras substâncias, as quais conseguimos perceber, como as cinzas, e as quais apenas instrumentos laboratoriais possuem a capacidade de medição e comprovação de sua existência, como os gases produzidos e emitidos pelo material em combustão.
As cinzas que restaram das memórias de mágoa, de revolta, de tristeza, de autopunição e de raiva serão limpas pelo elemento água, também sob orientação de um Dragão, mas desta vez o oriental. O desenho corporal tanto do Dragão quanto da serpente alada tem a característica sinuosa que representa as ondulações da água e do fogo, ambos os elementos dançam de maneira infinita em ondas. Estas ondas possuem uma função útil no sistema, qual seja a de preservar aquilo que é necessário (representado pelo vale no corpo), e de transportar aquilo que é desnecessário para o indivíduo (representado pela crista). O mesmo princípio ocorre na morfologia natural dos rios que é desenhado em meandros (ao passo que o ser humano torna-o reto, através da destrutiva canalização), pois a filtração da água originária nos planaltos e no alto dos vales e a manutenção e contenção de suas margens é a dinâmica ideal e intrínseca para que o sistema bacia hidrográfica mantenha-se em equilíbrio em cada setor e para que a água despejada nos mares esteja limpa.
As salamandras, personificações dos elementais que cuidam do elemento fogo, também possuem a mesma característica sinuosa da serpente alada e trabalham o fogo a partir de uma dança que movimenta a matéria, dando-lhe a destinação adequada.
Desta maneira, tanto o fogo, como elemento descompactador, quanto a água, como elemento de limpeza, estão à disposição de todos aqueles que necessitam sentirem-se mais leves das cargas inoportunas e que atrapalham o desenvolvimento do Espírito.
Que nós possamos aproveitar o ano do Dragão e Renovar as nossas ideias e percepções do mundo e das pessoas. Todo solo só é fértil quando o fogo limpa as ervas daninhas e quando a água retira os cascalhos.


revista 250- O consolador

 

terça-feira, 16 de outubro de 2012


A transitória maldade humana
Para a Doutrina dos Espíritos o mal é criação do próprio homem e
não tem existência senão temporária, transitória, uma vez
que faz parte do aprendizado
(1ª Parte) *
“E as paixões hoje são quase as mesmas de ontem, senão mais açuladas,
mais violentas e devastadoras no homem, que prossegue
inquieto.” - Joanna de Ângelis

A maldade dos homens sempre inquietou os pensadores dos mais diversos campos do saber e da ação humana: filosofia, ciência, arte, religião.  

Recentemente o Jornal do Brasil publicou em seu caderno Ideias uma resenha sobre uma obra que trata deste tema. O livro em questão é O mal no pensamento moderno, de Susan Neimam, e o título e subtítulo da matéria, assinada por Joel Macedo, é também expressivo: “O mal nosso de cada dia - Filósofa parte do terremoto de Lisboa para mostrar como o mal deixou de ser divino para se tornar criação do homem”.  

Para a autora, o terremoto de Lisboa em 1755 é um divisor de águas nas concepções sobre o mal. Antes deste evento que abalou a Europa, prevalecia “a visão de males naturais como punição para males morais”.
Nas palavras do resenhista:  
Lisboa aboliu as causas morais, absolveu Deus e os pecados coletivos, e os terremotos passaram a ser vistos como desastres naturais, algo fora da intenção divina ou responsabilidade humana. Explicar o mal como processos naturais, implicando mais a natureza em si, foi uma forma de tornar o mundo menos ameaçador. 
Deus não é mais agente punitivo, causa de males que retornam aos homens como forma de castigo. O mal, depois de Lisboa, é reduzido ao seu aspecto moral, aquele praticado pelo homem, por deliberação de sua vontade.  
Dentro de certos padrões previsíveis, os males humanos pareciam não mais destinados a inquietar os filósofos, pois que o mal parecia ter limites... O Holocausto (extermínio dos judeus e outras vítimas durante a Segunda Grande Guerra), no entanto, reavivou a discussão sobre os limites da barbárie, da perversão humana, lançando na atmosfera intelectual europeia e mundial uma onda de pessimismo e descrença.   
Apesar da descrença na Providência Divina, que se acentuaria no pós-guerra, vozes se levantaram para absolver Deus, por sua possível omissão diante das atrocidades. (Não se acredita muito Nele, mas quando ocorre algo grave, O acusamos de não se fazer presente, quando Ele, na verdade, nem mesmo fora convidado a participar de nossas vidas, antes das tragédias...)  
Estamos nos referindo particularmente a Hanna Arendt, filósofa judia, radicada nos Estados Unidos. Ela estudou profundamente as questões do mal e suas discussões estão presentes no livro Eichmann em Jerusalém, que trata do julgamento do carrasco nazista, responsável pela morte de milhares de pessoas.  
Partindo do caso Eichmann, ela pondera que o mal pode tornar-se banal e espalhar-se pelo mundo dos homens como um fungo, porém apenas em sua superfície. As raízes do mal não estão definitivamente instaladas no coração do homem e, por não conseguirem penetrá-lo profundamente a ponto de fazer nele morada, podem ser arrancadas.  
A sua defesa da Divindade encontra-se no trecho de uma carta enviada a um amigo, na qual afirma que “o mundo como Deus o criou parece-me um mundo bom”. 
Com Deus absolvido (mesmo que parcialmente) pela criação do mal e suas consequências, vejamos a visão espírita sobre esta questão. 
A visão espírita do mal 
Para a Doutrina dos Espíritos o mal é criação do próprio homem e não tem existência senão temporária, transitória, pois no arranjo maior da Vida não tem sentido a permanência do mal. O mal, desta forma, faz parte do aprendizado, porém na condição de resíduo; por isso, ele deve ser descartado em algum momento.  
Conforme Kardec aponta em Obras Póstumas, “Deus não criou o mal; foi o homem que o produziu pelo abuso que fez dos dons de Deus, em virtude de seu livre-arbítrio”. Este pequeno trecho compõe um dos mais belos ensaios que Kardec deixaria, não intencionalmente, para publicação posterior. Trata-se de O egoísmo e o orgulho: suas causas, seus efeitos e os meios de destruí-los.  
O mestre lionês, ao desenvolver o tema, parte do pressuposto de que o instinto de conservação, natural e necessário para a sobrevivência do homem, está na origem do egoísmo e do orgulho. Este e outros instintos têm a sua razão de ser. No entanto, o homem abusa destes instintos, por conta do apego às sensações que as impressões da matéria lhes causam.  
Vive, então, (e aqui começa nossa análise), a sua longa epopeia rumo à maturidade, devendo liberar-se de tudo que signifique retenção a esta fase infantil, de imaturidade, de apego ao ego, em que tudo deve girar ao nosso redor.  
Na mensagem “A lei de amor”, de Lázaro, presente em O Evangelho segundo o Espiritismo, o autor afirma que  
Em sua origem, o homem só tem instintos; quando mais avançado e corrompido, só tem sensações; quando instruído e depurado, tem sentimentos. E o ponto delicado do sentimento é o amor...
Os instintos, as sensações e os sentimentos estarão presentes na existência humana em determinadas combinações, durante todo o processo evolutivo, com a preponderância de alguns sobre os outros.  
Na fase inicial de sua jornada – na condição de simples e ignorante – é possível que o instinto lhe seja o melhor guia; à medida que desenvolve as potências da alma – a inteligência, a vontade –, ele tende a apegar-se às sensações, pois não desenvolveu ainda, na mesma proporção, os sentimentos, que permanecem como presença latente e promessa futura; como a inteligência desenvolve-se mais rapidamente, na ausência de sentimentos como a fé, a esperança, a caridade, o homem tende a prender-se às sensações materiais; por fim, aliando a inteligência (instruído) e as experiências de vida (depurado), os sentimentos começam a ocupar maiores espaços de manifestações anímicas no homem.  
Podemos, assim, afirmar que os instintos e as sensações ainda convivem conosco hoje, pois, como Espíritos encarnados, imersos em um corpo físico, estamos sujeitos às leis e às atrações da matéria, porém os sentimentos tendem a dominar-nos a alma, aliados à inteligência, que já temos desenvolvido sob as suas diversas modalidades.  
Retomando o ensaio de Kardec, este vai insistir no debate em torno do egoísmo e do orgulho, situando-os como causa de todos os males.  
Um outro conceito precisamos analisar, porém, neste momento, antes de prosseguirmos e aprofundarmos esta questão. Trata-se do conceito de paixão. 
O conceito de paixão 
A definição de paixão encontrada nos dicionários pode nos ajudar a compreender, antecipadamente, o que desejam expressar os Espíritos e Kardec quando se utilizam deste termo. Segundo o Aurélio, paixão é um: “Sentimento ou emoção levados a um alto grau de intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão; Amor ardente; Inclinação afetiva e sensual intensa; Entusiasmo muito vivo por alguma coisa; Atividade, hábito ou vício dominador”. 
Lendo um pequeno trecho das páginas iniciais de O Livro dos Espíritos (Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita), encontramos Kardec a expressar-se nestes termos (p. 25): 
O Espírito encarnado se acha sob a influência da matéria; o homem que vence esta influência, pela elevação e depuração de sua alma, se aproxima dos bons Espíritos, em cuja companhia um dia estará. Aquele que se deixa dominar pelas más paixões, e põe todas as suas alegrias na satisfação dos apetites grosseiros, se aproxima dos Espíritos impuros, dando preponderância à sua natureza animal. (grifo nosso) 
Na mesma Introdução, quando trata da escala, das classes em que podemos situar os Espíritos em sua trajetória evolutiva, o codificador afirma (p. 24): 
Os [Espíritos] das outras classes se acham cada vez mais distanciados dessa perfeição, mostrando-se os das categorias inferiores, na sua maioria eivados das nossas paixões: o ódio, a inveja, o ciúme, o orgulho etc. Comprazem-se no mal. (grifo nosso) 
Cabe-nos, agora, destacar que o egoísmo e o orgulho compõem o que Kardec designa como sendo as paixões. O que podemos confirmar quando lemos mais adiante, ainda na Introdução (p. 27): 
Ensinam-nos que o egoísmo, o orgulho, a sensualidade são paixões que nos aproximam da natureza animal, prendendo-nos à matéria; que o homem que, já neste mundo, se desliga da matéria, desprezando as futilidades mundanas e amando o próximo, se avizinha da natureza espiritual. (grifo nosso) 
No capítulo em que trata da escala espírita, Kardec, ao situar os Espíritos imperfeitos na terceira ordem, traça como seus caracteres gerais (p. 89): “Predominância da matéria sobre o espírito. Propensão para o mal. Ignorância, orgulho, egoísmo e todas as paixões que lhes são consequentes”. (grifo nosso) 
Será necessário darmos agora um salto e nos localizarmos na parte terceira de O Livro dos Espíritos (Das Leis Morais), no capítulo XII, Da perfeição moral, no item denominado justamente Paixões. Abrangendo seis questões (907 a 912), Kardec faz um estudo breve, porém aprofundado deste tema, no diálogo que trava com os Espíritos superiores que colaboram com a Codificação.  
Em resumo eis o que apreendemos: 
·        As paixões são constitutivas, fazendo parte do que podemos denominar de natureza humana. O seu princípio não é originariamente mau, pois “o princípio que lhe dá origem foi posto no homem para o bem”. São os acréscimos nossos, da vontade humana, os excessos, pois o “abuso que delas se faz é que causa o mal”. (questão 907) 
A fronteira entre o bem e o mal 
Como já comentado por Kardec em linhas atrás, certas paixões “nos aproximam da natureza animal”; desligando-se, porém, o homem da matéria e suas atrações, por meio da ação de amor ao próximo, ele se aproxima “já neste mundo” de sua natureza espiritual. (grifo nosso)  
Podemos inferir, pois, que as paixões, este “entusiasmo muito vivo por alguma coisa” ou este “sentimento ou emoção levados a um alto grau de intensidade”, na definição do Aurélio, transita na visão espírita da natureza animal à natureza espiritual. instinto de conservação que nos impele a buscar tudo para nós mesmos, no desejo de preservarmos nossa vida a qualquer custo, em detrimento da vida alheia (quando próximos da natureza animal, nos primórdios das experiências humanas), transitamos para um outro extremo, que é a abnegação, que também na definição do Aurélio significa “renunciar a; sacrificar-se, mortificar-se, em benefício de Deus, do próximo, de si mesmo”. Não à toa, o próprio sacrifício de Jesus, mormente na tradição católica (a morte na cruz), é denominado de Paixão (o próprio Aurélio indica o uso da maiúscula para assim o designar). 
·        O governo da paixão é o que determina o limite em que se situa a fronteira entre o bem e o mal. A paixão se torna um perigo quando perdemos o domínio sobre ela e causamos males aos outros ou a nós mesmos. Como alavanca que pode decuplicar nossas forças, se mal acionada e direcionada pode voltar-se contra nós e nos esmagar. (questão 908) 
Na resposta dos Espíritos a Kardec é ainda dito que as paixões se assemelham a um corcel, um cavalo veloz, “que só tem utilidade quando governado e que se torna perigoso desde que passe a governar”. A própria sabedoria popular nos ensina que a vaidade, ou o egoísmo ou o orgulho não causam mal desde que em doses adequadas. Frases  como “um pouco de vaidade faz bem à pessoa” e outras do gênero (quando ditas com sinceridade) correspondem exatamente ao que os Espíritos em outras palavras referem-se ao domínio das paixões.   
É dito também que as paixões, além de ampliar as forças humanas, “auxiliam na execução dos desígnios da Providência”.  
A paixão, como define o Aurélio, é também um ”entusiasmo muito vivo” e o termo entusiasmo corresponde a “exaltação ou arrebatamento extraordinário daqueles que estavam sob inspiração divina”, também significando “dedicação ardente, ardor”. Logo, o homem quando se torna entusiasmado, no sentido mais elevado do termo, pode auxiliar nas tarefas que a Providência Divina lhe designa e de que o homem é instrumento.   
·        O princípio das paixões tem por fundamento um “sentimento” ou uma “necessidade natural”; logo, as paixões não podem ser concebidas como um mal em si, pois elas são “uma das condições providenciais da nossa existência”; o excesso na utilização desta  ferramenta é que causa o mal; as paixões que o aproximam da natureza animal o afastam da natureza espiritual; haverá, por outro lado, “predominância do espírito sobre a matéria” quando os homens utilizarem as paixões como instrumento a serviço dos bons sentimentos, o que os conduzirá mais rapidamente à perfeição que nos cabe atingir. (questão 908) 
·        Os esforços, as tentativas para se atingir uma meta, podem conduzir o homem a “vencer as suas más inclinações”. Porém o homem não costuma exercitar-se neste sentido, o que lhe exigiria, em verdade, “esforços muito insignificantes”. (questão 909) 
A importância da vontade 
Kardec e os Espíritos relacionam nesta questão a má utilização das paixões e as más inclinações, tendências, tornando-as sinônimas. Os Espíritos então nos afirmariam, de outra forma, que o governo, o domínio que se pode ter sobre as paixões não exige, comumente, grandes esforços, mas apenas dedicação, persistência.  
·        O homem pode contar com os Bons Espíritos, cuja missão é auxiliá-los, caso deseje vencer suas más paixões ou inclinações. (questão 910) 
Há uma inscrição no pórtico de Delfos, na Grécia, dizendo que “invocado ou não ele estará sempre presente”; a Divindade ou Deus sempre está presente em nossas vidas, mesmo que não solicitemos... O mesmo ocorre com os bons Espíritos, que nos assistem, auxiliando-nos sempre. A despeito de nossa rebeldia e, às vezes, do nosso mergulho deliberado no mal, eles esperam pacientemente uma oportunidade para nos reerguer, colocando-nos em condições de retomar a caminhada no rumo do Bem. Se invocados (e invocar é solicitar ajuda ou intercessão de alguém) ou se evocados (evocar é chamar a si, reclamar a presença de alguém), os Espíritos amigos haverão de nos auxiliar a vencer nossas más paixões ou más tendências, inclinações.   
·        A vontade pode sempre triunfar sobre as más paixões, dominando-as. Os homens, no entanto, que se comprazem com o mal, que lhes proporciona prazer, pela afinidade com tudo o que se aproxima dessa sua transitória, mas obstinada natureza animal, são aqueles cuja “vontade só lhes está nos lábios”. Aqueles que compreendem “a sua natureza espiritual” lutam por reprimir as próprias más tendências. “Vencê-las é, para eles, uma vitória do espírito sobre a matéria.” (questão 911) 
É mais fácil, cômodo, enganar-se, iludir-se, do que se enfrentar nas lutas sem quartel que se tem que travar para a vitória sobre si mesmo, contra o mal existente dentro de nós mesmos. A alavanca férrea da vontade, que nos pode ajudar a remover todos os obstáculos do caminho, precisa ser forjada todos os dias, retemperada pela oração e pela vigilância.  
É necessário, portanto, estarmos atentos e em comunhão com o Alto, para não nos amolentarmos, pois é comum nos deixarmos arrastar pelos cantos de sereia da preguiça, da acomodação e dos prazeres que a isto conduz ou implica.   
·        Por fim, o antídoto recomendado pelos Espíritos no combate que se deve travar para vencer-se o “predomínio da natureza corpórea” é a prática da abnegação. (questão 912) 
A própria definição do que é abnegação indica o que nos cabe fazer: “renunciar a; sacrificar-se, mortificar-se, em benefício de Deus, do próximo, de si mesmo”. Os verbos de que o dicionarista se utiliza para definir abnegação nos sugere dois tipos de atitude: a ativa e a passiva.  
A raiz de todos os males 
Renunciar a alguma coisa é, aparentemente, uma atitude passiva de deixar-se, abandonar-se, apagar-se ou até de fugir de alguma situação. No entanto, ninguém pode renunciar às coisas do mundo em favor de algo ou alguém sem que mobilize as forças do pensamento e do coração, com “dedicação ardente, ardor” próprio de quem mobiliza o entusiasmo naquilo em que se empenha. A abnegação é, enfim, um sentimento de renúncia, de sacrifício, de anulação do ego para a vivência ativa do amor ao próximo.  
Bem, depois de termos examinado as questões 907 a 912, sobre as paixões, cabe-nos indicar que as questões que se seguirão tratam do egoísmo. Da questão 913 a 917, Kardec e os Espíritos dialogam sobre esta “verdadeira chaga da sociedade”. Às más paixões ou más inclinações Kardec designará agora como vícios, como se vê na questão 913: “Dentre os vícios, qual o que se pode considerar radical?”  
A resposta é naturalmente o egoísmo, que está na raiz de todos os males (daí o adjetivo radical utilizado na pergunta). E continuam os Espíritos: “Por mais que lhes deis combate, não chegareis a extirpá-los, enquanto não atacardes o mal pela raiz, enquanto não lhe houverdes destruído a causa. Tendam, pois, todos os esforços para esse efeito...” (grifos nossos) 
E ao final da resposta os Espíritos são claros:  
Quem quiser, desde esta vida, ir aproximando-se da perfeição moral, deve expurgar o seu coração de todo sentimento de egoísmo, visto ser o egoísmo incompatível com a justiça, o amor e a caridade. Ele neutraliza todas as outras qualidades. 
A ideia de que o egoísmo e o orgulho possam ser situados como causa de todos os males humanos pode causar mal-estar a muitos que se propõem a examinar estas questões. Os Espíritos e Kardec, de modo simples e coerente, são muito felizes em situar no campo das causas últimas o papel das paixões ou dos sentimentos do egoísmo, do orgulho e outros assemelhados. Tudo o mais estaria no campo dos efeitos, que podem tornar-se causa de outros efeitos. A miséria sócio-econômica, por exemplo, pode ter sua origem na extrema concentração de renda em determinado país ou região. Na visão espírita, sem desprezar as análises sociológicas, econômicas ou quaisquer outras, a causa deste fenômeno está no egoísmo e no orgulho dos homens, em última instância. A extrema concentração de renda, alegada como causa, na verdade seria um efeito da causa primordial que são as  más paixões. 

* Leia a conclusão deste artigo na próxima postagem.